Mediando a palavra no mundo com o Outro
“[...] Para mim, seria impossível engajar-me num
trabalho de memorização ,mecânica dos ba-be-bi-bo-bu, dos la-le-li-lo-lu. Daí
que também não pudesse reduzir a alfabetização ao ensino puro da palavra, das
sílabas ou das letras. Ensino no qual o alfabetizador fosse “enchendo” com suas
palavras as cabeças supostamente “vazias” dos alfabetizandos. [...]” (Hara,
1992 apud Freire)
Sem
dúvida alguma, ao nos declinarmos sobre assunto tão instigante quanto crítico
como é a alfabetização, é inescapável fundarmos nossas reflexões e ações sobre
os pilares engendrados por aquelas e aqueles que assumiram que este é o ponto
de partida para todas e todos que trilham a caminhada pela sociedade
grafocêntrica, fundada sobre alicerces robustos, porém fragilizados pela
ausência de muitos daqueles e daquelas que não estão inseridos naquela por não
serem alfabetizados ou letrados.
De fato estamos sob uma “dicotomia
gerada”, qual seja alfabetizado X letrado, pela ausência de debates robustos
por aqueles e aquelas que atuam como profissionais da Educação, especificamente
os docentes no que tange à aquisição da leitura e da escrita, quais as nuances
encontradas nas diferentes realidades e as particularidades identificadas de
acordo com as vivências de cada sujeito que chega ao sistema educacional.
Pode-se dizer que há dicotomia
entre alfabetização e letramento quando não compreendemos que ao adquirir
competência para utilizar como ferramenta de comunicação e interação, a leitura
e a escrita nos mais variados ambientes e situações, o sujeito é capaz de
decodificar, produzir e agir sobre/no ambiente e com seus pares, portanto
“acrescentando a ela (realidade) algo que ele mesmo é fazedor.” (HARA, 1992 apud FREIRE)
Consoante Hara (1992) apud Freire
“[...] entende alfabetização como um ato de
conhecimento, no qual “ aprender a ler e a escrever já não é, pois, memorizar
sílabas, palavras ou frases, mas
refletir criticamente sobre o próprio processo de ler e escrever e sobre o profundo significado da linguagem.”
De acordo Cury (2000, p.3) apud
Soares (1998, p.19)
“[...] define que letramento é resultado da ação de ensinar ou de aprender a ler ou
escrever: o estado ou a condição que adquire um grupo social ou um indivíduo
como consequência de ter-se apropriado da escrita [...]”
De tal forma que, o sujeito é alfabetizado quando
reflete sobre o que lê e escreve de maneira crítica, como também é letrado como
quando se apropria da leitura como também da escrita, portanto letramento e
alfabetização são complementares e não opostos, e somente serão se @s
educador@s não forem mediador@s entre o conhecimento construído e as vivências
que serão ferramentas na aquisição da linguagem, que é veículo do pensamento.
Em sala de aula é comum a presença de alun@s que
não leem o que escrevem, o fazem de maneira mecânica. As solicitações para que
leiam um enunciado vem acompanhada de “não entendi”, quando o que acontece é a
incompreensão da escrita como um meio de comunicação.
Esta situação é rica para aquel@s que trabalham com
os Anos Iniciais do Ensino Fundamental, pois é possível utilizar jogos,
brincadeiras, diferentes gêneros textuais para tornar lúdicas as atividades e
poder ir inferindo sobre os aspectos que contribuem para que as crianças não
percebam que a escrita é a grafia do pensamento, uma das linguagens possíveis
para que o Outro possa acessar o que pensam/elaboram.
Na Interdisciplina
Didática, Planejamento e Avaliação fizemos uma viagem na história da
Educação e no caminho encontramos Comênio[i], o pai da didática, definida como a Arte de
ensinar. No compêndio Didática Magna, Comênio assevera que é possível ensinar e
aprender sem enfado, com prazer e que “os fundamentos de todas as coisas que se
aconselham são tirados da própria natureza das coisas”(COMÉNIO, 1995, p.525) E
desta forma tenho planejado o cotidiano com a turma, avaliando e reescrevendo
os projetos e planejamentos.
Utilizo as rimas, parlendas, lenga-lengas, cédulas,
materiais concretos, saídas de campo e outros recursos para ir dialogando sobre
as observações, aplicações possíveis com aquilo que manuseiam e solicito que
anotem, escrevam um recado para os familiares, um bilhete para a Diretora,
façam um final diferente, uma nova rima e assim os indivíduos vão grafando e
refletindo, falando e criticando a sua produção e refazendo conforme encontram
algo que não compreendem ou percebem que está incompleto.
Enquanto indivíduo em uma sociedade
grafocêntrica é imperativo que a palavra escrita e falada tenha significado e
este é parte integrante da palavra, pertencendo ao domínio da linguagem e ao
domínio do pensamento, pois uma palavra sem significado é um som vazio. (SILVA,
2010 apud VYGOTSKY, 2005)
A Interdisciplina Educação de
Jovens e Adultos no Brasil oportunizou que refletíssemos sobre as
peculiaridades vivenciadas por aqueles sujeitos excluídos das diferentes formas
de expressão, cidadania e mercado de trabalho por serem analfabetos ou
iletrados e quais as possibilidades de reinserção daquelas ao protagonismo e
autonomia.
Fomos
provocadas para a reflexão-ação pela Interdisciplina citada, a partir das
leituras e da prática de observação em salas de aula da EJA e deste laboratório
foi possível compreender o quanto a linguagem
é ferramenta potente do pensamento.
Para compreender como o humano
adquire a linguagem, esta que é instrumento do pensamento e equaliza homens e
mulheres como seres grafocêntricos, aprofundamos os estudos realizados por
teóricos como Skinner, Chomsky, Vygotsky e outros na Interdisciplina Linguagem e Educação e inspiradas naqueles
elaboramos um planejamento de aula para ser aplicado em nossas turmas e este
deveria ter como objetivo principal o desenvolvimento da linguagem.
As possibilidades que se
apresentam ao elaborarmos um instrumento, no qual prevemos estratégias e
avaliação são inúmeras, entre aquelas a pesquisa de diferentes estratégias e recursos.
A necessidade em inovar exige que
tenhamos em vista o que queremos e enquanto educadora pretendo oferecer
oportunidades para que os educandos possam agir sobre o ambiente e interajam
com o/s Outro/os. Para tanto, inovar
pedagogicamente requer uma ruptura necessária que permita reconfigurar o
conhecimento para além das regularidades propostas pela modernidade (CUNHA,
2004)
Efetivamente a Interdisciplina Educação e Tecnologias da Comunicação e Informação
propôs diferentes atividades nas quais tivemos de utilizar recursos em
diferentes plataformas, pesquisas e avaliações e consequentemente fomos além
das regularidades até então praticadas como docentes.
Ao inovarmos é inevitável a
reflexão sobre modelos pedagógicos e modelos
epistemológicos, que são diferentes modos de ensinar/aprender e a
resultante destes é o imperativo para selecionarmos quais recursos e
estratégias se adequam àqueles.
Sobre os modelos pedagógicos e
epistemológicos fomos provocadas pela Interdisciplina
Seminário Integrador à descrição de uma Cena na qual uma escola
abarcava os diferentes modelos pedagógicos e epistemológicos, definidos por
Fernando Becker (1995) como pedagogia diretiva, pedagogia não-diretiva e,
talvez criando um novo termo, pedagogia relacional.
A atividade instigou à reflexão
da minha prática docente, das condições nas quais fiz a formação como “Normalista[ii]”, que recursos, estratégias utilizo para
sensibilizar @s educand@s, no que tange
à curiosidade, pesquisa, interesse e percebi que é comum planejar uma aula com
referencial na Pedagogia Relacional, porém me deparo com encaminhamentos da Diretiva,
pois assim fui formada para o oficio, e na condição de graduanda PEAD tenho
sido motivada para continuar aprofundando as pesquisas, elaborações, a formação
de rede entre os pares e destes arranjos ir desenvolvendo as competências para
planejar e atuar dentro dos parâmetros da Pedagogia Relacional.
Referências:
BECKER, Fernando. Modelos pedagógicos e modelos
epistemológicos. Educação e Realidade, Porto Alegre, p.89-96, 01 jun. 1994.
Semestral. 19(1). Disponível em:
<https://pt.scribd.com/document/260250772/BECKER-Fernando-Modelos-pedagogicos-e-modelos-epistemologicos-2-pdf>.
Acesso em: 10 abr. 2018.
COMÉNIO, João Amós. Didácta Magna:
tratado da arte de ensinar tudo a todos. 4. Ed. Lisboa: Fundação Calouste
Gulbenkian, 1996. 525 p. Disponível em: https://moodle.ufrgs.br/course/view.php?id=51541 Acesso em: 12/08/2018
CUNHA, M. I. Inovações pedagógicas e a
reconfiguração de saberes no ensinar e no aprender na universidade. Anais ... VIII
Congresso Luso-Afro-Brasileiro de Ciências Sociais. Coimbra, Portugal, 2004,
p.1-16. Disponível em: <https://www.ces.uc.pt/lab2004/pdfs/MAriaIsabelCunha.pdf>.
Acesso em: 20 jun. 2018.
HARA, Regina. Alfabetização de Adultos: Ainda um
Desafio. Cedi - Centro Ecumênico de Documentação e Informação, São Paulo,
p.26-34, 1988. Disponível em: <http://www.bibliotecadigital.abong.org.br/bitstream/handle/11465/1685/19.pdf?sequence=1&isAllowed=y>.
Acesso em: 01 out. 1988.
______Id. Ibid.
PARECER CNE/CEB 11/2000 HOMOLOGADO: Parecer
Conselho Nacional de Educação. 11. ed. Brasília, BRASÍLIA: Mec, 19 maio 2000.
Parecer. Disponível em:
<http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/pceb011_00.pdf>. Acesso em: 10
maio 2000.
SILVA, Samanta Demétrio da. Aquisição da Linguagem.
Webartigos, Porto Alegre, p.01-12, 2010. Disponível em:
<https://www.webartigos.com/artigos/aquisicao-da-linguagem/43208>. Acesso em: 22 jul. 2010.
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