Mediando a palavra mundo
“[...]
Dá o dedo aí [...]” é parte do relato realizado por um adulto não escolarizado
sobre uma situação constrangedora vivenciada pelo mesmo por não saber “assinar
corretamente[i]”.
Essa
situação e tantas outras são parte do cotidiano de milhares de jovens e adultos
que tiveram suas trajetórias alteradas pelas condições social e/ou econômica,
portanto casos que necessitam diferentes abordagens para que aqueles possam
participar, de maneira plena e cidadã, do mundo construído por gerações de
homens e mulheres.
As
estratégias, os recursos, as metodologias devem ser capazes de atender as
demandas destes grupos que trazem experiências das diversas interações, seja no
trabalho formal/informal, constituição de família e outras.
Regina
Hara nos convida para uma reflexão sobre sujeitos não alfabetizados e suas
relações com a construção do conhecimento, a partir das concepções de Paulo
Freire sobre aprendizagem e processo pedagógico e das contribuições de Emília Ferreiro
e Ana Teborosky que tratam da construção do conhecimento e da escrita, para
tanto apresenta um relato de caso que, de acordo com a autora,
é
produto de um ano letivo, onde se procurou ligar o embasamento teórico que
construímos com as possibilidades reais de sala de aula, onde pudéssemos ter
controle do desenrolar da experiência.(HARA, 1992, p.18)
A
proposta implementada foi estruturada a partir da constatação de que alguns
indivíduos não se apropriavam da escrita, daquela que os tornaria sujeitos de
criação. O ponto de partida foi o pensamento comungado por Paulo Freire, Emília
Ferreiro e Ana Teborosky de que o homem é sujeito
cognoscente e construtor de seu conhecimento (1992, p.4)
O
levantamento realizado para compreender como os indivíduos participantes da
classe escreviam, demonstrou que a escrita daqueles se equiparavam aos estágios
identificados em crianças, portanto o embasamento nas teorias desenvolvidas por
Ferreiro e Teborosky contemplaram o planejamento.
Muito
interessante refletir junto à autora sobre o caso, pois de imediato me recordo
das diferentes Hipóteses da escrita que encontro enquanto docente. Tem sido
desafiante desenvolver estratégias para atender tão díspares solicitações e
necessidades geradas pelas crianças e o quanto é gratificante perceber que a
evolução de uma hipótese à outra é resultante das intervenções realizadas em colaboração
ao esforço das/os estudantes para progredir e se expressar através da escrita.
Conforme
Hara,
Dominar
o código escrito não é o resultado mecânico de treinamentos de habilidades e
coordenações. Entender a escrita como um sistema de representações que se
construiu socialmente na história do homem e saber que seu domínio é um
processo cognitivo, nos obriga a pensar
esse objeto quando nos dispomos a atuar como alfabetizadores. A pensá-lo não
apenas como usuários, mas compreendendo sua estrutura e o alcance de sua função
social. (HARA, 1992, p.8)
Enquanto
alfabetizadores, somos os mediadores das relações estabelecidas entre os
indivíduos e o código escrito, capacitando este para ser um suporte de
interação com o Outro e no mundo.
Enfim,
estar atento à leitura de mundo dos alfabetizandos é imprescindível para aquelas/es
educadoras/es que compreendem que, segundo Freire
a
palavra para Paulo estava sempre irremediavelmente imbricada, vinculada ao ato
de escrever, ao sujeito que lê/escreve; ao que se passa ou se passou no mundo
concreto, como o vemos e interpretamos diante da ideologia que temos e
praticamos. (FREIRE, 2015, p.292)
Referências:
FREIRE. Ana Maria
Araújo. A leitura do mundo e a leitura da
palavra em Paulo Freire. Cad. Cedes, Campinas, v. 35, n. 96,
p. 291-298, maio-ago., 2015 Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/ccedes/v35n96/1678-7110-ccedes-35-96-00291.pdf
Acesso em: 06/06/2018
HARA, Regina.
Alfabetização de adultos: ainda um desafio. 3. ed. São Paulo: CEDI, 1992
Disponível em: https://moodle.ufrgs.br/pluginfile.php/2431939/mod_resource/content/0/Alfabetizacao_de_adultos__Regina_Hara.pdf
Acesso em: 05/06/2018
____ibid., p.4
____ibid., p.8
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