sábado, 14 de outubro de 2017

                                          Outros Territórios


“ [...] diversos Territórios Negros Urbanos vêm sendo conquistados e mantidos no contexto sócio-cultural dos espaços sociais da metrópole porto-alegrense ou, então, desaparecendo por razões históricas, urbanas ou políticas. Ao mesmo tempo, os segmentos negros os fazem ressurgir em outros lugares e espaços sociais, atualizando antigos significados ou, produzindo, socialmente, novos significados. “ (Junior, 2017, p. 56)

Sem dúvida alguma, a ação humana sobre o espaço físico derivará da resistência, da criatividade e da necessidade e as resultantes daquela ficarão gravadas no meio ambiente, produzindo territórios significativos, no caso em questão, os Territórios Negros Urbanos.
São Territórios Negros Urbanos em Porto Alegre  somente aqueles inventariados no Museu de Percurso do Negro em Porto Alegre ou existem outros que carregam os significados produzidos por homens e mulheres que resistem e insistem?
É inegável que não se limita aos gravados no inventário citado, pois “uma cultura supõe a existência de um grupo que a crie lentamente, a viva e a comunique [...] “ (Munanga, 2012, p. 29), portanto se a cultura é construção no tempo e é vigorosa, exige a presença constante de novos atores que possam imprimir inquietações e soluções que respondam aos desafios constantes gerados pelas disputas inerentes às alteridades. Conforme (Arena; Lopes,2013, p. 1.158 apud Bakhtin, 2003, p.341)

“ [...] o homem não tem um território interior soberano, está todo e sempre na fronteira; olhando para dentro de si ele olha nos olhos ou com os olhos do outro “.

Destas trocas constantes surgem grupos, consolidam-se espaços sociais que sustentam e impulsionam o devir numa constante (re) criação dos Territórios Negros, especialmente em Porto Alegre que é o lócus em questão.
Para exemplificar,  há o grupo de teatro Pretagô[i] que surgiu a partir de uma proposição de estágio de Camila Falcão, então estudante do curso de Artes Dramáticas da UFRGS e este trabalho rendeu uma primeira montagem para sala de teatro, qual seja, “Qual a diferença entre charme e funk?” em 2014 e no ano seguinte a peça AfroME, desenvolvida para ser apresentada em um ambiente alternativo, qual seja, um bar. Estes dois trabalhos foram idealizados e apresentados pela estudante, pelas atrizes Kyky Rodrigues, Laura Lima, Manuela Miranda e Silvana Rodrigues, pelos atores Bruno Cardoso e Bruno Fernandes, os músicos João Pedro Cé, Duda Cunha e Vini Silva, a figurinista e produtora Mari Falcão e o diretor Thiago Pirajira.

AdicioGrupo Pretagô é uma das atrações do Em Cena ANDRÉ OLMOS/DIVULGAÇÃO/JC - Jornal do Comércio/22/09/2017 - Jornal do Comércio (http://jcrs.uol.com.br/_conteudo/2017/09/cadernos/viver/586233-atracoes-do-porto-alegre-em-cena-entram-na-reta-final.html)



As inquietações que moveram o grupo na direção que perseguem até então, foram como a juventude negra percebe o espaço social que habita e frui, a inexistência de peças teatrais nas quais as atrizes e atores sejam negras e negros, os papéis impostos aos sujeitos negros nas relações sociais, exclusão e remoção da população negra desde que a cidade iniciou o processo de expansão, ou seja, temáticas caras aos afro-brasileiros que são cidadãos de direito e de fato.
Retratando a época na qual estão imersos, atrizes e atores revivificam a cultura trazida de África de forma dramática, tal e qual o foi para aquelas e aqueles que atravessaram o Oceano de maneira imposta.
Pretagô. Todas e todos, mulheres e homens, territórios forjados desde sempre na luta pela dignidade usurpada e pela esperança em ser um com o outro.

Referências:
ARENA. Dagoberto Buim; LOPES. Naiane Rufino. PNBE 2010: personagens negros como protagonistas. Educação e& Realidade, Porto Alegre, v.38, n. 4, p. 1147-1173, out/dez. 2013.
JUNIOR. Iosvaldyr Carvalho Bittencourt. Territorialidade Negra Urbana: a evocação da presença, da resistência cultural, política e da memória dos negros, em Porto Alegre, delimitando espaços sociais contemporâneos. Apostila do curso de Formação: Territórios Negros: patrimônios afro-brasileiros em porto Alegre. 3ª edição. 2017.
MUNANGA. Kabengele. Sociedades, civilizações e culturas africanas. Origens africanas do brasil contemporâneo: histórias, línguas, culturas e civilizações. 3ª edição. São Paulo: Gaudí Editorial, 2012.









[i] https://www.youtube.com/watch?v=gRuYWAeAges
                                Pluralidade na escola: desafio a ser superado

No ano de 2015, lecionava para uma turma de 3º Ano do Ensino Fundamental e dentre os alunos havia três alunos negros e destes somente um conseguia se posicionar diante dos colegas, através de opiniões e brincadeiras.
Em decorrência desta situação, iniciei um trabalho afirmativo através da música brasileira consolidada e de matriz afrodescendente e das histórias infantis que traziam personagens etnicamente marcados pela ascendência africana.
Deste trabalho em diante comecei a notar que os três alunos, uma menina e dois meninos, iniciaram o processo de construção do espaço junto aos colegas através de histórias vivenciadas nas suas famílias e comunidades, como por exemplo, contando que participavam de um grupo de crianças na comunidade e nela havia o resgate das raízes, relatando que a mãe cantava em uma escola de samba e que o mesmo acompanhava tocando chocalho e instrumento de percussão.
Percebendo a riqueza cultural destas manifestações e o quanto as mesmas impactavam na formação daqueles alunos, solicitei à Diretora que incluísse um espaço para que o grupo de crianças da comunidade viesse até a escola, junto à Griô[i] que os acompanhava, para que apresentassem alguma atividade que desenvolviam e a resposta foi que não havia espaço na festa referida para este tipo de manifestação.
Fiquei impactada, pois a festa de São João é a festa brasileira que acolhe as manifestações populares de todas as culturas.
Porém, naquele momento não havia na instituição arcabouço para seguir pleiteando a inclusão daquela atividade representante da cultura afro-brasileira na festividade.
Do mesmo modo as instituições de ensino agiram ao longo das décadas, pois a formação cultural ocidental carrega as marcas do etnocentrismo, que em última instância preconiza a supremacia de um grupo étnico, nação ou nacionalidade em detrimento de contribuições irrefutáveis na formação de um povo.

De acordo com Missio & Cunha apud Pérez Gómes (2001)
É fácil reconhecer como a escola, filha privilegiada do Iluminismo moderno, exerceu e continua exercendo um poderoso influxo etnocêntrico. A escola está reforçando de maneira persistente a tendência etnocêntrica dos processos de socialização, tanto na delimitação dos conteúdos e valores do currículo que refletem a história da ciência e da cultura da própria comunidade como na maneira de interpretá-los como resultados acabados, assim como na forma unilateral e teórica de transmiti-los e no modo repetitivo e mecânico de exigir aprendizagem. (Pérez Gómez, 2001, p. 35)

Portanto, a formação de alunas e alunos nas instituições escolares carece de pluralidade cultural e de espaços multiculturais capazes de abarcar as diferentes contribuições trazidas e assimiladas pelos descendentes dos povos que formaram a nação brasileira.

Referências:







[i] http://www.processocom.org/2016/06/01/a-importancia-de-grios-na-socializacao-de-saberes-e-de-fazeres-da-cultura/

quinta-feira, 12 de outubro de 2017

                         Territórios Negros: territorialidade



 “[...]territorialidades se configuram no cotidiano, nas práticas dos agentes no território habitado, que, neste sentido, se configura sempre, em alguma medida, como território vivido, usado, significado”. Ana Lucia Enne e Marina Dutra (2016) apud Rogério Haesbaert (2004) e Milton Santos (1994)[i]



Indiscutivelmente, o território é onde os indivíduos plasmam o cotidiano e o devir, através das interações necessárias e inescapáveis que lhes garantam condições para produzir a subsistência, dar vazão à criatividade e serem portadores de direitos e garantias sociais.

Os significados oriundos das interações irão gradualmente modelando o território e deste movimento surge a territorialidade, que é o espaço físico circunscrito por pessoas e a cultura que resulta das práticas vivenciadas.

De acordo com Iosvaldyr Carvalho Bittencourt Junior Território Negro Urbano é



“[...]um espaço de construção de singularidades socioculturais de matriz afrobrasileira que é afirmativo e, ao mesmo tempo, é um objeto histórico de exclusão social em razão da expropriação estrutural dos direitos sociais, civis e específicos fundamentais dos negros brasileiros, o que faz existir uma constante resistência.” [ii]



Portanto, os Territórios negros são resultado da tensão resultante das disputas pelos direitos de ser e estar, de pertencer e inferir no espaço escolhido pelos indivíduos ou imposto pelo Estado.






A perigosa viagem de barco até à Grécia vista pelos olhos de uma raparig...



                               Crianças refugiadas: sujeitos fragilizados

Uma menina de sete anos torna-se mais um número dentre aquelas que perdem o direito à pátria e tudo aquilo que naquela poderiam almejar um futuro. Dentre as perdas, uma escola e a professora que, na memória de Malak a menina refugiada, nunca a deixava triste.

Relato pujante que os remete ao ofício que molda nossos dias docentes, que revigora a determinação em sermos alguém que sugere e apresenta possibilidades em um vasto mundo onde todas as pessoas tenham seus direitos protegidos.


O motivo que sustenta a escolha deste vídeo é ele ser uma denúncia das atrocidades vivenciadas por crianças que, apesar da tenra idade, são expulsas de seus países e as consequências são inúmeras e dentre elas a perda dos laços que as sustentam e oferecem a base para o pleno desenvolvimento.

                                     Sistemas de ensino e Inclusão

Leciono em uma escola que pertence ao mesmo bairro onde se localiza uma Comunidade Remanescente de Quilombos, já titulada, qual seja Areal da Baronesa. Deste Quilombo, a escola acolhe alunas e alunos e aquela ainda não previu ações capazes de inseri-los como membros da comunidade que compõe o bairro, portanto não são reconhecidos como tal. O que os diferencia como membros de uma comunidade remanescente de quilombolas deveria fazer parte do planejamento do PPP para que a instituição escolar pudesse discutir e fomentar ações capazes de tornar visíveis e aceitos comportamentos resultantes da vida em comunidade efetivamente.

   Conforme orientações e normativas expedidas pelo MEC, "os sistemas de ensino (estaduais e municipais) incluam as escolas localizadas em Comunidades Remanescentes de Quilombos nas demandas relacionadas à infraestrutura, formação de professores e aquisição de materiais didáticos específicos."

    Se algumas escolas acolhem alunos e alunas daquelas comunidades e havendo dispositivos legais e normativos para que sejam elaboradas práticas que sejam efetivas para o processo de inclusão daqueles, por que os discentes, oriundos das comunidades quilombolas ainda não são efetivamente acolhidos como tal?


                                            Estudo e pesquisa: exigência docente        Ensejando a continuidade dos estudos e porvent...